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Você está aqui: Página Inicial / Revista / Versão impressa / Número 3 - Dezembro/Junho de 2009 / A Muralha Chinesa contra a Crise

A Muralha Chinesa contra a Crise

Resumo O artigo aborda os impactos da atual crise capitalista na economia chinesa. De forma preliminar, analisa a inserção da China no mundo pós-retorno das crises cíclicas, voltando-se particularmente para a crise asiática de 1997 e o momento atual. O objetivo é identificar o papel do socialismo com as particularidades chinesas no enfrentamento das crises capitalistas.

Antonio Cícero Cassiano Sousa

Doutor em História, diretor do CEPPES e professor na Eteab/Faetec

 

Introdução

 

O presente artigo aborda os impactos da atual crise capitalista na economia chinesa. De forma preliminar, pretendo observar a inserção da China no mundo pós-retorno das crises cíclicas, voltando-me particularmente para a crise asiática de 1997 e o momento atual. O objetivo é identificar o papel do socialismo com as particularidades chinesas no enfrentamento das crises capitalistas.

 

1. A partilha da China e a teoria do imperialismo

 

No processo de competição intercapitalista, alguns detêm vantagens sobre os outros, da livre concorrência nascem os monopólios para que a expansão se dê de forma mais intensa. O que V. I. Lênin identifica, na passagem do século XIX para o século XX, é o fim da livre concorrência, dando lugar a uma outra muito mais feroz, a concorrência entre os monopólios:

 

Naturalmente que, sob o capitalismo, o monopólio não pode nunca eliminar do mercado mundial, completamente e por um período muito prolongado, a concorrência (esta é, diga-se de passagem, uma das razões pelas quais a teoria do ultra-imperialismo é um absurdo)”1.

 

Concorrência e expansão estão associados, daí Lênin afirmar:

Mas quanto mais rápido é o desenvolvimento do comércio do capitalismo, mais intensa é a concentração da produção e do capital que gera o monopólio. E os monopólios nasceram , precisamente da livre concorrência! Mesmo se os monopólios refrearem atualmente o seu desenvolvimento, isto não é, apesar de tudo, um argumento a favor da livre concorrência, que se tornou impossível depois de ter gerado os monopólios.2 (grifos de Lênin)”.

 

Os monopólios derivam da livre concorrência, mas não a eliminam completamente. A existência do capitalismo, na fase atual, supõe rivalidade interimperialista, mesmo que haja a hegemonia de uma única potência militar.

Para Lênin, as duas novidades do capitalismo de fim de século eram os monopólios e o capital financeiro, o que justificava caracterizá-lo como uma nova etapa. Os monopólios nascem da tendência à concentração, detectada por Marx na sua teoria da acumulação capitalista. Lênin insiste também no aparecimento de um novo tipo de capital – o capital financeiro, fruto da fusão do capital bancário com o capital industrial. As duas características centrais são assim sintetizadas:

 

“O imperialismo é o capitalismo na fase de desenvolvimento em que ganhou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro, adquiriu marcada importância a exportação de capitais, começou a partilha do mundo pelos trusts internacionais e terminou a partilha de toda a terra entre os países capitalistas mais importantes”3.

As relações entre capital financeiro e Estado assumem dupla face: internamente o Estado se constitui numa importante base para sua reprodução, por meio de mecanismos como os títulos da dívida pública, em países com pequena acumulação privada, os Estados serão submetidos pelas nações imperialistas:

O capital financeiro é uma força tão considerável, pode dizer-se tão decisiva, em todas as relações econômicas e internacionais que é capaz de subordinar, e subordina realmente, mesmo os Estados que gozam da independência política mais completa (...) Mas compreende-se, a subordinação mais lucrativa e ‘cômoda’ para o capital financeiro é uma subordinação tal que traz consigo a perda da independência política dos países e dos povos submetidos”4.

 

A partilha da China ocorre ainda sob o imperialismo inglês, responsável pelo fim do antigo poder e da abertura do país à pilhagem estrangeira; ao mesmo tempo, esta intervenção provocava uma resistência popular capaz de realizar importantes ações contra os interesses estrangeiros e seus aliados internos. Ao contrário do conflito de 1840-42, a segunda guerra anglo-chinesa (1857-58), conhecida como Guerra do Ópio, fortaleceu o nacionalismo chinês e a luta tomou aspecto de guerra popular, capaz de infligir derrotas e desmoralizar o inimigo com os envenenamentos, motins, seqüestros e outras formas de luta, distintas dos meios de guerra ordinários dos mercadores ocidentais. Esta redescoberta do orgulho nacional preparou caminho para revoltas populares e o advento da república em 1911.

Rebeliões populares e luta para expulsar o invasor estrangeiro compõem um cenário de cem anos de luta antiimperialista que deságuam na Revolução Comunista de 1949. A Rebelião Taiping (1850-1865) foi outro desses movimentos; no caso, de caráter político-religioso e modernizante, contrário aos privilégios da nobreza e defensor de uma nova ordem social, que incluía, entre outros aspectos, a reforma agrária.

A partilha da China em áreas de influências começou com a agressão do Japão em 1894-1895, estabelecendo uma região sob o seu controle no Nordeste. A Rebelião dos Boxers (1898-1901) se voltou particularmente contra esses acordos de abertura da China ao imperialismo e contou com o apoio do governo imperial até ser esmagada pelas tropas imperialistas quando as armas prometidas pelo governo não chegaram.

Acrescente-se a isso a luta contra a nova invasão de seu território pelas tropas japonesas, em 1931, e a guerra que se prolonga até a rendição do Japão, em 1945, como outro fator de coesão, nesse segundo caso, sob a direção crescentemente majoritária do Partido Comunista, já que o Kuomitang (Partido Nacionalista do Povo) afirmava-se cada vez mais colaboracionista.

A China mantém-se próxima da União Soviética até o rompimento no início dos anos 60. A seguir, volta-se prioritariamente para os problemas internos até a abertura de final da década de 70.

Durante cem anos, os chineses lutaram contra a transformação de seu país numa semicolônia. A partilha da China se insere na nova fase que o capitalismo consolida na segunda metade do século e adquire uma forma própria, já que por sua tradição e formação estatal não poderia ser transformado simplesmente numa colônia. Nesse país, concessões, privilégios pessoais e econômicos estabeleceram uma opressiva intervenção estrangeira, em aliança com setores internos.5

 

2. China hoje e a teoria marxista das crises capitalistas

 

Há dois aspectos que devem ser destacados na análise das crises capitalistas. O primeiro aspecto a destacar é a tendência decrescente (relativa) da taxa de lucros. Este é o maior paradoxo do capitalismo: tem como essência a busca do lucro e encontra-se enredado numa trama onde esta tendência se apresenta ameaçadora. Ao distinguir entre capital constante e capital variável, Karl Marx afirma que é este que incorpora valor, mas é aquele que se transforma progressivamente na parte mais cara da produção à medida que o emprego de máquinas cada vez mais sofisticadas é imperioso para o aumento da produtividade.

O aumento progressivo do capital constante em relação ao variável deve necessariamente ter por consequência queda gradual na taxa geral de lucro, desde que não varie a taxa de mais-valia ou o grau de exploração do trabalho pelo capital.

Para impedir que esta tendência se afirme, o modo de produção capitalista deve recorrer ao aporte cada vez maior de capital, seja constante, na forma de novos equipamentos, seja na extração de mais sobretrabalho, na forma de compressão de salários e outros recursos (mais recentemente temos observado o retorno de formas de acumulação primitiva: trabalho informal, trabalho infantil, etc.). Marx diz “que as mesmas causas que fazem a taxa geral de lucro tender para baixo determinam acumulação acelerada do capital”, o que produz aumento absoluto da mais-valia e do lucro.

A necessidade de acumular leva à superprodução, como Marx e Engels já identificavam em 1848:

 

Nas crises declara-se uma epidemia social que teria parecido um contra-senso a todas a todas as épocas anteriores – a epidemia da superprodução. A sociedade vê-se de repente retransportada a um estado de momentânea barbárie: parece-lhe que uma fome, uma guerra de destruição generalizada lhe cortaram todos os meios de subsistência; a indústria e o comércio parecem-lhe aniquilados. E porquê? Porque a sociedade possui civilização em excesso, meios de subsistência em excesso, comércio em excesso. As forças produtivas de que dispõe deixam de servir a promoção das relações de propriedade burguesas; pelo contrário, tornam-se demasiado poderosas para estas relações, e são por elas tolhidas; e assim que superam este obstáculo lançam na desordem toda a sociedade burguesa, põem em perigo a existência de propriedade burguesa. As relações burguesas tornaram-se demasiado estreitas para conterem a riqueza por elas criada. – E como supera a burguesia as crises? Por um lado, pela destruição forçada de uma massa de forças produtivas; por outro lado, pela conquista de novos mercados e pela exploração mais profunda de mercados velhos. Como, então? Preparando crises generalizadas e mais graves, e reduzindo os meios para prevenir as crises”6.

 

Como já vimos, a extração de mais-valia comprime salários, o exército industrial de reserva assegura as baixas salariais e o consumo se restringe, confirmando que capitalismo não produz para atender ao consumo e sim ao lucro. A restrição ao consumo assume papel importante na origem das crises:

 

(...) as crises só seriam explicáveis pela desproporção entre os diferentes ramos de produção e pela desproporção entre o consumo e a acumulação dos próprios capitalistas. Mas, no estado de coisas reinante, a reposição dos capitais aplicados na produção depende, em grande parte, da capacidade de consumo das classes não produtivas, enquanto a capacidade de consumo dos trabalhadores está limitada pelas leis do salário e ainda pela circunstância de só serem empregados quando o puderem ser com lucro para a classe capitalista. A razão última de todas as crises reais continua sendo sempre a pobreza e a limitação do consumo das massas em face do impulso da produção capitalista: o de desenvolver as forças produtivas como se tivessem apenas por limite o poder absoluto de consumo da sociedade”7.

 

Acrescente-se que, hoje, mais de um terço do comércio internacional é realizado nos limites das corporações multinacionais, seja entre filiais de uma mesma empresa ou entre corporações.8

O segundo aspecto é a pletora financeira, identificada nas formas que o capital assume, desde o capital comercial até o capital financeiro. As formas mais importantes são as do capital mercantil, capital industrial, capital produtor de juros e capital bancário. No entendimento das crises capitalistas, o capital bancário assume importância central:

 

O sistema bancário é, pela forma de organização e pela centralização, o resultado mais engenhoso e mais refinado a que leva o modo capitalista de produção (...) Sem dúvida estabelece-se por esse meio a forma de contabilidade geral e repartição dos meios de produção em escala social, mas a forma e nada mais (...) Em consequência eliminam o caráter privado do capital, e encerram em potência, mas só em potência, a abolição do capital. O sistema bancário retira das mãos dos capitalistas privados e dos usurários a repartição do capital, o negócio específico e a função social do sistema. Mas, por isso, os bancos e o crédito ao mesmo tempo se tornam o mais poderoso meio de impelir a produção capitalista além dos próprios limites, e um dos veículos mais eficazes das crises e da especulação”.9

 

Os bancos se tornam empresas ultramodernas e responsáveis pelo caráter não puramente privado do capitalismo monopolista. O capital financeiro, fruto da fusão do capital industrial com o capital bancário, nasce da produção, mas precisa voltar-se cada vez mais para fora dela, na tentativa de fugir das crises:

 

Num sistema de produção em que o mecanismo do processo de reprodução repousa sobre o crédito, se este cessa bruscamente admitindo-se apenas pagamento de contado, deve evidentemente sobrevir crise, corrida violenta aos meios de pagamentos. Por isso, a primeira vista, toda a crise se configura como simples crise de crédito e crise de dinheiro”.10

 

Este afastamento da base produtiva dá-se sem qualquer dependência efetiva da acumulação real:

 

(...) pode ocorrer acumulação de capital de empréstimo sem qualquer acumulação real, por processos puramente técnicos, como ampliação e concentração dos bancos, economia das reservas de circulação ou ainda dos fundos de reserva de meios de pagamentos de particulares; daí resultam sempre conversões em capital de empréstimo por prazos curtos. Esse capital de empréstimo, embora assuma essa forma sempre por períodos curtos (daí ser chamado de capital flutuante, floating capital, e deverem os descontos ser feitos por períodos curtos), flui e reflui sem cessar. O que um tira da circulação, outro nela repõe. A massa de capital-dinheiro de empréstimo (não falamos aqui de empréstimos a longo prazo, mas de empréstimos a prazo curto baseados em letras e depósitos) aumenta desse modo sem qualquer dependência efetiva da acumulação real”.11

 

Comparando o crescimento da base produtiva e da base monetária, hoje, Bevilaqua assim observa este componente central da crise geral capitalista:

 

(...) o crescimento da produção mundial, até o momento, se sustenta numa base monetária, que cresce 20 vezes mais rápido e, em investimentos e empréstimos, sete vezes maiores. Só o movimento diário do câmbio externo aumentou de US$ 15 bilhões, em 1973, para US$ 1,2 trilhão, em 1995. As compras e vendas internacionais de títulos e ações por investidores americanos aumentaram de 9% do PIB, em 1980, para 164%, em 1996”.12

 

Verificamos assim que a teoria do imperialismo de Lênin deriva da teoria da acumulação de Marx, constituindo a teoria marxista das crises capitalistas, conforme aponta Bevilaqua.

Vejamos os dois aspectos centrais dessa conexão. O primeiro ponto é aquele já ressaltado acima, da associação entre a lei geral da acumulação capitalista e os monopólios. Para Marx, a livre concorrência gera a concentração de renda que, por sua vez, leva ao monopólio. Reafirmando estes postulados, Lênin verá os monopólios como intensificação e não a negação da concorrência. O segundo ponto de conexão entre os dois autores é a questão da metamorfose do capital. Marx estuda a formação do capital bancário e o capital portador de juros e identifica sua contribuição para a expansão do capitalismo como também para suas crises.

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Revolta camponesa na China do século XIX

Semelhante percepção tem Lênin dessas transformações do modo capitalista de produção:

 

O capitalismo, na fase imperialista, conduz à socialização integral da produção nos seus mais variados aspectos; arrasta, por assim dizer, os capitalistas, contra sua vontade sem que disso tenham consciência, para um novo regime social, de transição entre a absoluta liberdade de concorrência e a socialização completa.

A produção passa a ser social, mas a apropriação continua a ser privada. Os meios sociais de produção continuam a ser propriedade privada de um reduzido número de indivíduos. Mantém-se o quadro geral da livre concorrência formalmente reconhecida, e o jugo de uns quantos monopolistas sobre o resto da população torna-se cem vezes mais duro, mais sensível, mais insuportável”.13

 

No momento de eclosão da crise asiática de 1997, a China atuava como competidora dos chamados “Tigres Asiáticos”, expandindo-se para áreas comerciais importantes; acrescente-se ainda que no mesmo ano, recuperava a ex-colônia britânica de Hong-Kong.

Como se encontra a economia dez anos depois? Há três características da orientação política que a fazem uma importante trincheira neste cenário de retorno das crises cíclicas.

Primeiro, vai continuar crescendo em 2009 a uma taxa de 8 a 8,5%, declinando em apenas 1 ponto do ano de 2008.

Em segundo lugar, continua empenhada em fazer da exportação e fortalecimento do mercado interno faces da mesma moeda. Sabe-se que as exportações representam 35% do Produto Interno Bruto, com a economia mundial em crise para quem a China vai vender? Essa não é uma pergunta feita pelos chineses, depois que a crise se instalou. Há tempos o governo vem investindo no fortalecimento do mercado interno, na estabilidade do yuan e na promoção de empregos. Dessas três metas, o aumento do consumo doméstico será uma boa resposta às dificuldades criadas pelo declínio das exportações. A universalização dos serviços públicos e dos direitos sociais colocou o país numa situação invejável que só os hipócritas não conseguem ver quando repetem o “samba de uma nota só” dos baixos salários chineses. O salário numa economia socialista se reveste de outro caráter pois incorpora o aluguel subsidiado, o acesso à saúde e educação e demais direitos sociais. Enquanto os governos capitalistas socorriam os bancos, o governo chinês aprovava um pacote de 570 bilhões para investimentos em construção popular, saneamento, eletricidade, transporte, recuperação do meio ambiente, apoio às pequenas e médias empresas, racionalização das indústrias e reconstrução de áreas destruídas por desastres naturais.

O terceiro aspecto que distingue a China é o controle que exerce sobre o mercado financeiro. Nas bolsas chinesas, o capital estrangeiro precisa de autorização para transações na conta de capital (compra de ações), também não há mercado de futuros e nem especulação com o dólar, sendo crime qualquer transação interna com moeda estrangeira.

O crescimento econômico chinês tem sólidas bases internas. A preocupação com o mercado interno não tem motivações conjunturais; com a crise asiática de 1997, as exportações também declinaram e a decisão foi expandir os gastos públicos e os investimentos das empresas estatais. Essa ênfase no mercado interno associa-se à busca da elevação constante do nível de vida dos chineses, cumprindo a meta de assegurar alimentação e abrigo e marchar para uma “vida modestamente confortável”, como defendem os dirigentes da China. A estabilidade do yuan é outro fator de fortalecimento do mercado interno.

A agricultura continua sendo a base da economia nacional chinesa. Com as reformas, a produtividade cresce significativamente. No entanto, o grande crescimento da demanda interna exige que se complemente com importações. Em contrapartida, a eficiência do grupo familiar no cultivo da terra tem produzido uma massa de milhões de camponeses que se tornam excedentes. Essa mão-de-obra itinerante passou a ser absorvida pelas empresas de distrito e vila (EDVs).

A China hoje é a quarta produção industrial do mundo: 50% das câmeras produzidas no mundo, 30% das televisões e aparelhos de ar condicionado, 25% das máquinas de lavar, quase 20% das geladeiras.

Desde 1993, a China passou a ser importadora de petróleo. Por sua vez, a Rússia renasceu como grande exportadora de energia nos últimos anos e tem sido vista como eventual alternativa pelos chineses para não ficarem dependentes do Oriente Médio. Em busca de fontes de combustíveis, o governo chinês tem desafiado as sanções estadunidenses em países com Iraque, Irã e Líbia.

Mantém-se sob controle estatal direto os setores de energia, recursos hídricos e minerais, silvicultura e usos do solo, câmbio, parte do setor financeiro e o controle populacional. Os principais bancos são propriedade do Estado. Os bancos e as empresas de seguro atuam separadamente para conter a especulação. O yuan permanece não é conversível, assim o país se protege da fuga de divisas e de problemas na balança de pagamentos.

 

Conclusões

 

A experiência histórica da China com as crises capitalistas recentes é positiva. Entre 1979 e 1983, o mundo capitalista viveu sob depressão econômica, enquanto os 800 milhões de chineses das áreas rurais aumentavam suas rendas em cerca de 70%. Na produção de cereais, o crescimento foi de 100 toneladas a mais do que na década anterior.

As respostas à crise de 1997 foram satisfatórias na medida que mantiveram o crescimento econômico e bons resultados na solução das demandas sociais. A solidez da economia chinesa a fez avançar nos mercados antes ocupados pelos “Tigres”, tornando-se grande exportadora mundial e a principal para os Estados Unidos da América.

Em 1929, todos os países entraram em crise, menos um – a República dos Sovietes. Hoje não dá para fazer uma comparação simplista, aproximando mecanicamente China e União Soviética, mas dá para dizer que a posição dos chineses é confortável e que o seu papel será cada vez mais relevante no cenário mundial: investem na África sob condições mais favoráveis que as instituições financeiras internacionais e fazem acordos bilaterais com Rússia, Irã e Iraque e Venezuela. A luta contra o imperialismo desde o século XIX, sua não capitulação na ofensiva neoliberal e a construção do socialismo, segundo as peculiaridades chinesas, explicam porque as atenções se voltam para a República Popular da China.

O povo chinês tem uma longa trajetória de luta contra o imperialismo e o seu Estado assimilou, desde a Revolução Comunista de 1949, uma importante experiência de promover o caminho de uma vida modestamente confortável para todo o povo e desenvolver suas instituições no sentido de enfrentar essa difícil situação mundial, agravada com o fim do sistema socialista. Os três pilares dessa política são a busca do crescimento econômico permanente, a conjugação de exportação e fortalecimento do mercado interno e controle sobre o mercado financeiro.

Hoje, a China se encontra, ao lado de Cuba, Coreia do Norte e Vietnã, na primeira linha da resistência ao neoliberalismo. Não capitularam no momento da ofensiva de 1989/91 e mantiveram o principio do planejamento estatal e controle social da propriedade privada, portanto, podem ouvir com tranquilidade os capitalistas falarem de intervenção do Estado... para salvar os bancos e o sistema financeiro, pois estão direcionando 570 bilhões para investimentos em infra-estrutura e produção. Os recentes cortes dos juros também visam estimular a produção. Outra muralha está sendo construída na China.

 

 

NOTAS

 

1 V. I. Lênin, O Imperialismo, fase superior do capitalismo, in Obras Escolhidas, 3ª ed., vol. 1, São Paulo, Alfa-Ômega, 1986, p. 650. A teoria do ultra-imperialismo foi formulada por Karl Kautsky, dirigente da social democracia alemã, e sugere a possibilidade da concorrência interimperialista ser conduzida por meios pacíficos, tendo como conseqüência prática a união entre proletários e burgueses.

2 Ibidem, p. 660.

3 Ibidem, p. 641-642.

 

4 Ibidem, pp. 636-637.

5 Ibidem, pp. 636-637.

 

6 K. MARX e F. ENGELS, p. 39-40.

7Karl MARX, O capital, livro 3, vol. 5, p. 556.

8 Paul HIRST e Grahame THOMPSON, Globalização em questão, p. 214.

9 Karl MARX, op. cit., pp. 695-696.

10 Ibid., p. 563.

11 Ibid., pp. 569-570.

11 Aluísio BEVILAQUA, Crise na Ásia: o Tufão e a Muralha de Papel, Rio de Janeiro, Inverta, 1998, pp. 57-58.