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Você está aqui: Página Inicial / Revista / Versão impressa / Número 3 - Dezembro/Junho de 2009 / A Crise do Capital e o Fim da Hegemonia Mundial dos EUA

A Crise do Capital e o Fim da Hegemonia Mundial dos EUA

O artigo aborda a crise financeira atual que ameaça jogar por terra a hegemonia mundial dos EUA e seu sistema imperial. Naturalmente, o império não cairá sozinho. O Brasil necessita urgentemente de um caminho alternativo para que o povo brasileiro não pague a conta das orgias dos banqueiros com o capital. O caminho é o de uma integração continental sob as bases distintas da doutrina neoliberal, que tenha como objetivo, além das trocas iguais das mercadorias, a demarcação de um cinturão de segurança alimentar proibido ao biodiesel, a defesa das reservas de água potável e a biodiversidade.

 

 

Introdução

O mundo inteiro começa a assistir à queda do Império dos Estados Unidos que, por cerca de 6 décadas seguidas, exerceu a hegemonia do sistema capitalista, sendo que, nas últimas duas, com a queda da ex-URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), tornou-se a maior potência mundial, configurando o que se denominou de unipolaridade mundial. Sem dúvida, parece paradoxal tal acontecimento justamente quando desaparece a única força que contrapunha sua hegemonia com relativo poder econômico, político e militar, conduzindo a cosmovisão socialista a uma crise ideológica sem precedentes. Mas, para a perplexidade dos protagonistas e antagonistas do sistema capitalista, a queda da URSS representou, em termos alegóricos, a “abertura da caixa de Pandora liberando todas as maldades” do sistema que voltam-se contra ele mesmo. Desde então, assistiu-se ao retorno das crises cíclicas do capital, revelando sua natureza estrutural e geral; assistiu-se também ao retorno da corrida neocolonial e armamentista, revelando uma nova crise de hegemonia mundial; e por último, a degenerescência de todos os paradigmas morais e teóricos do sistema, revelando-se uma crise ideológica. Quem tem acompanhado a nova manifestação da crise geral do capital em suas dimensões econômicas, sociais e políticas, tendo por epicentro basilar os EUA (Estados Unidos da América), voltou a conviver com o fantasma da crise iniciada em 1929: o crash financeiro, o suicídio, a depressão econômica, o desemprego, a fome, a corrupção, o fascismo e a guerra mundial. Diante deste fato, o problema que se impõe a todos que sofrem a opressão ou contestam o capitalismo é: QUE FAZER?

 

É natural que setores das oligarquias financeiras, por inércia ideológica e volume do seu capital, não admitam o desmoronamento, em tão pouco tempo, do mundo projetado: de ditadura do pensamento único neoliberal, de democracia política como valor universal e de unipolaridade mundial, sob a hegemonia dos EUA. Destes se pode esperar tão somente soluções de alto risco para toda a humanidade. Assim, cabe aos setores mais conscientes, especialmente aos comunistas revolucionários, em todas as partes do mundo, a habilidade necessária para conduzir este processo de transição da forma histórica da sociedade, em todos os seus aspectos fundamentais, capaz de superar esta pré-história no desenvolvimento humano. Mas exatamente neste momento de ruptura de paradigmas no sistema capitalista, a ausência de uma formação socioeconômica consolidada e de um movimento comunista mundialmente organizado com visão estratégica para toda humanidade e força capaz de dissuadir ações da reação imperialista se faz ressentir mais que em qualquer outro momento da história, projetando assim um novo período de grandes comoções políticas e sociais e o perigo de uma catástrofe mundial e humanitária.

Nestas circunstâncias, a resposta ao “Que Fazer?” exige daqueles que têm a coragem revolucionária de fazê-lo não esquecer as lições deixadas por Karl Marx: tanto nas Teses sobre Ludwig Feuerbach – “Os filósofos até agora não fizeram mais que interpretar o mundo de diferentes formas, quando o que se trata é de transformá-lo”1–; quanto no Dezoito Brumário de Luis Bonaparte“Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”2. Assim o “Por onde começar” consiste, precisamente, em saber até que ponto a atual manifestação da crise geral do capitalismo desenvolverá todas as condições objetivas para que as vanguardas revolucionárias em todas as partes possam conduzir a luta de classes a uma ruptura social de fato e não a uma farsa de um “Que Fazer?” inconsequente, pois como nos ensinou também Lênin:

 

as mudanças objetivas, não somente independem da vontade dos distintos grupos e partidos, mas também da vontade das diferentes classes (...). E o conjunto destas mudanças objetivas é precisamente o que se denomina situação revolucionária. (...) Porque nem toda situação revolucionária origina uma revolução, mas tão somente na situação em que às mudanças objetivas acima enumeradas se agrega uma mudança subjetiva, a saber: a capacidade da classe revolucionária de levar a cabo ações revolucionárias de massas suficientemente fortes para romper (ou enfraquecer) o velho Governo, que nunca, nem sequer nas épocas de crise, “cairá” se não o “fizer cair”.3

 

Características da hegemonia e contra-hegemonia aos EUA

 

Neste curto período histórico, caracterizado pela hegemonia mundial dos EUA, podemos destacar como fatos que singularizam a mesma, os seguintes: 1) a expansão do modo de produção capitalista sobre os ex-países socialistas e a intensificação da exploração por este nos países já submetidos ao seu sistema social, como se pode comprovar por: a) a revolução informacional ou cibernética (recomposição tecnológica do aparelho produtivo capitalista); b) o fenômeno da globalização neoliberal (Estado mínimo, privatização, desregulamentação do trabalho e da mão-de-obra); e c) liberdade para os fluxos do capital financeiro (orgia do capital especulativo – hedge funds) e agigantamento do exército industrial de reserva; 2) o crescimento do número de conflitos bélicos e o retorno das guerras imperialistas, elevando a presença militar dos EUA em todas as partes do mundo, configurando o fenômeno da unipolaridade mundial; 3) o retorno da manifestação cíclica da crise estrutural do capitalismo de forma geral (econômico, social, político e militar), global e adquirindo caráter permanente; 4) a passagem da crise do capitalismo da esfera estrutural do modo de produção na sociedade humana para a esfera ambiental e humanitária, ameaçando todas as formas de vida, em especial a humana, no planeta.

Estes fatos, no entanto, não subsistem de “per si”: eles coexistem, dialeticamente, na relação contraditória com outros fenômenos que emergiram em oposição aos mesmos na cena histórica atual, minando o mundo de sonhos das oligarquias imperiais, em especial a estadunidense e sua alegoria do “império onde o sol nunca se põe”. Assim formou-se o impasse fundamental vivido pelo sistema que se apresenta na crise do capital financeiro atual e que ameaça repetir sob novo plano histórico a grande crise de 1929 e seus desdobramentos (crash das bolsas, suicídios, depressão econômica, desemprego em massa, guerra e mudança na hegemonia), pois as mesmas contradições que afirmam a sua existência, dialeticamente, impedem sua reestruturação produtiva (mudança no padrão industrial); consequentemente, a sua mudança no padrão de acumulação de capital (elevação no montante da acumulação), logo, negando a realização de suas estratégias de domínio, em todas as esferas sociais (resistência difusa a unipolaridade), por conseguinte sua hegemonia.

 

a) A resistência à expansão neoliberal do imperialismo

É possível comprovar a formação destes elementos de contra-hegemonia ao sistema imperialista, em especial aos Estados Unidos, partindo dos elementos de oposição que se desenvolvem em contradição aos traços característicos deste período de unipolaridade mundial. Ao processo de expansão e intensificação do sistema capitalista (a globalização neoliberal), vimos crescer em todas as partes do mundo um grande movimento de resistência das mais variadas formas. De um modo geral, podemos congregá-lo em cinco grandes linhas: a) a primeira formada pela resistência dos países socialistas que não acompanharam a capitulação da URSS – Cuba, Coréia do Norte, China e Vietnã; b) a segunda linha formada pelos países sob governos nacionalistas ou fundamentalistas nos países árabes (Palestina, Afeganistão, Iraque, Irã, etc.), nos países remanescentes do Leste europeu (Iugoslávia, Rússia, Mongólia, etc.) e, atualmente, os países da América Latina (Venezuela, Bolívia, Nicarágua e Equador); c) a terceira linha de resistência se compõe dos movimentos revolucionários armados socialistas ou independentistas (EZLN no México, FARC-EP e ELN na Colômbia, MRTA no Peru, PT Turco, PCML do Nepal, FDR das Filipinas, etc.); d) a quarta linha de resistência se desenvolveu do movimento operário e popular, ONGs e partidos reformistas, apoiados em governos social-democratas, formando-se como movimento antiglobalização, cuja expressão máxima é o Fórum Social Mundial e; e) a quinta linha de resistência é a formada pelos grupos anticapitalistas, compostos por organizações revolucionárias comunistas, anarquistas e radicais individualistas, que oscilam entre as quatro primeiras linhas.

No desenrolar deste processo pode-se observar, de acordo com o ascenso e o descenso da luta de classes, a mudança no papel protagonista entre estes grupos na luta de resistência, tendo como marco mais visível a passagem da liderança do movimento antiglobalização para os povos árabes (Palestina, Iraque, Afeganistão, Irã, etc.), a partir do ataque às Torres Gêmeas e ao Pentágono, nos EUA. Com o desfecho da guerra no Afeganistão e Iraque, e a passagem da luta de estado nacional e guerra regular para a luta de movimento de resistência e irregular, o protagonismo da resistência tem se deslocado, gradualmente, para os países da América Latina, destacadamente a Revolução Bolivariana na Venezuela. O papel principal deste país se explica pela capacidade do seu processo revolucionário polarizar: seja a resistência socialista (Cuba), seja a  revolucionária armada (FARC-EP), seja a luta anticapitalista (organizações revolucionárias comunistas) e, ainda que secundariamente, a resistência nacionalista e social-democrata. Portanto, conjuga as forças de resistência aos EUA e ao imperialismo, numa conjuntura de crise mundial do capital que eleva sua importância geopolítica no continente e no mundo.

 

b) A expansão militar e o déficit dos EUA

O segundo traço que caracteriza o momento histórico é o crescimento dos conflitos bélicos em resistência à recolonização neoliberal e à presença militar dos EUA mundialmente. Os dados sobre os conflitos fornecidos pela ONU mostram que: de 1980 a 1990, houve 3 guerras; de 1990 a  2000, 5 guerras; de  2000 a  2008, já ocorreram 4 guerras. Dos 28 conflitos contemporâneos (últimas 3 décadas), 11 deles se iniciaram nos anos 90 e 5 a partir de  2000, sendo que 7 continuam se desenvolvendo. Em todos estes conflitos, se pode comprovar a presença direta ou indireta dos Estados Unidos. Um recente mapa animado publicado pela Revista Mother Jones sob o título Misson Creep: US Military Presence Worlwide4, utilizando dados do Pentágono sobre o envio e localização de tropas militares dos Estados Unidos em todo o planeta desde a metade da década de 1950 até  2007, indica o enorme poder militar estadunidense em todo o planeta. Desde 11 de setembro, os EUA aumentaram em mais de 20% sua presença militar no mundo - hoje mantêm cerca de 300 mil soldados em mais de 140 países. Seu orçamento militar entre  2001 e  2007 aumentou 59%, representando 45% de todos os gastos militares mundiais, segundo o Instituto Internacional de Pesquisa da Paz em Estocolmo (SIPRI), em estudo publicado em 10 de junho de  2008.

 

A este movimento militar dos EUA, sob a escatologia de “justiça infinita versus o eixo do mal” (o combate ao terrorismo), as demais potências foram arrastadas a uma nova corrida armamentista e preparação para uma nova guerra de partilha do mundo. Segundo o SIPRI (Stockholm International Peace Research Institute), os gastos militares, mundialmente, aumentaram 45% nos últimos dez anos. Entre  2006 e  2007, os orçamentos militares dos países aumentaram cerca de 6%. As exportações da indústria bélica, entre 2002 e 2007, aumentaram em 7%. Os gastos globais com equipamento bélico em 2007 foram de US$ 1,339 trilhão. EUA, Rússia, França, Reino Unido e Alemanha representam juntos 80% das transações. Entre os maiores compradores, de  2003 a 2007, estão a Coréia do Sul, China, Turquia, Grécia, Índia, Israel, Arábia Saudita e África do Sul. Na América do Sul, os maiores compradores neste período foram o Chile e a Venezuela. O Brasil é o 12º maior investidor militar do mundo. A Rússia aumentou seu orçamento militar no ano passado em 13% em relação a 2006. A China triplicou os gastos no período entre 1998 e 2007.

Par e passo a este processo, as históricas contradições interimperialistas amalgamadas ao longo da guerra fria e da bipolaridade mundial, sob o manto do combate à URSS, ressurgem  mesclando-se com novas contradições resultantes do momento atual. O impasse na OMC (Organização Mundial do Comércio), na OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), na ONU (Organização das Nações Unidas), na assinatura do Tratado de Kyoto, demonstra a profusão dos elementos de contra-hegemonia na esfera econômica, política e militar entre EUA, França, Alemanha, Inglaterra, Japão e Rússia, transformando todas as regiões do planeta em grandes campos minados, prestes a explodirem ao primeiro deslize, por reação em cadeia. A guerra da Rússia contra Geórgia pela Ossétia do Sul, a aproximação com a Venezuela, a invenção da bomba a vácuo e o lançamento do seu próprio sistema de posicionamento global (GPS), demonstram a mudança das bandeiras. O impasse nuclear no Oriente Médio (Israel e Irã, Índia e Paquistão), Ásia (Coréia do Sul e Coréia do Norte) e as contradições na América Latina (Colômbia e Venezuela, Peru e Equador, Brasil e Bolívia) tornam-se potenciais detonadores de uma nova catástrofe para a humanidade, a exemplo da Primeira e Segunda Guerras Mundiais.

Mas a questão militar é mais profunda no capitalismo, como já haviam analisado Marx e Engels. O complexo industrial-militar, desenvolvido ao longo da guerra fria e da corrida aeroespacial, tem por objeto o mercado da guerra, incidindo tanto na economia como na política e dialeticamente dependente das leis que as regulam. Em termos econômicos, se produzem mais-valia, necessitam realizá-la, pois trata-se de uma indústria de alta composição orgânica de capital e renovação tecnológica constante, logo, gerando investimentos de altos custos; em termos políticos, necessitam da guerra para se desenvolver, pois nos períodos de paz torna-se insustentável. E neste aspecto se encontra um dos mais importantes elementos de contra-hegemonia que os EUA criam contra si mesmos. O complexo industrial-militar estadunidense que

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Manifestação de desempregados

tem por objeto assegurar a sua hegemonia mundial e a reprodução do modo de produção capitalista, paradoxalmente, se converteu numa estrutura que desestabiliza e nega esta hegemonia, golpeando a base fundamental da mesma: a economia e a política. Uma análise do seu reflexo na crise geral do capitalismo nos EUA indica, claramente,  que o aumento de sua presença militar no mundo e a sustentação do seu complexo industrial-militar constituiu-se em um dos principais fatores que impulsionam a falência econômica e política do Estado americano, como é visível pelo endividamento interno que equivale a 100% do seu PIB e do seu consumo. O déficit público atingiu a cifra dos US$ 600 bilhões; o déficit em contas correntes, no ano de  2005, já havia chegado aos 6,5% do valor total do PIB; considerando que os gastos militares atuais representam cerca de 4 a 5% do PIB, se pode ter uma idéia da importância destes gastos para insolvência do Estado americano.

Os cientistas Stiglitz e Bilmes publicaram pesquisa que mostra que a guerra de Bush no Iraque custou, só aos EUA, 3 trilhões de dólares. Neste estudo estão apenas incluídos os gastos bélicos diretos que se refletem no orçamento. Mas, para se chegar ao custo real, deve-se acrescer ainda os custos propriamente econômicos, que são calculados com base nos efeitos macroeconômicos e econômico-planetários da guerra, em pelo menos mais 3 trilhões de dólares. Segundo os dois cientistas, este montante total de 6 trilhões de dólares, que equivale aproximadamente ao valor de todas as reservas de ouro e divisas mundiais, é uma estimativa conservadora. Todos os meses os EUA precisam desembolsar mais de 16 bilhões de dólares em custos correntes para as guerras do Iraque e do Afeganistão, além dos 439 bilhões de dólares do orçamento de defesa. Com a privatização da guerra, 180.000 mercenários das empresas de segurança contratados para o Iraque pelo Pentágono custam, em média, dez vezes mais do que custa um G.I. regular (soldados de infantaria) – 400.000 dólares por ano contra 40.0005.

 

c) A crise estrutural e geral do capital

O aparato militar bélico e repressivo não impulsiona apenas a falência do império dos EUA, ele também explica a base fundamental e a essência da crise do capital que se tornou visível nas últimas 4 décadas (1973, 1980, 1989, 1998 e 2007) elevando-a da condição de crise do modo de produção social para uma crise ambiental que ameaça a vida no planeta. A crise energética, que se anunciou em 1973, não foi uma crise – como muitos pensavam – que refletiu apenas as contradições sociais da política de monopólio, dada a nova composição da OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo) em função das transformações políticas no mundo árabe. Ela, sobretudo, enunciou as novas condições técnicas e de valor na composição orgânica do capital (a relação entre capital variável e capital constante - homem/máquina) que a guerra fria (a corrida armamentista e aeroespacial) aportaria à economia mundial, dando lugar à revolução informacional, como expressão máxima ao que se convencionou chamar revolução científico-técnica. Eis, portanto, um outro ângulo para analisar a importância da estrutura militar na crise geral do sistema: como setor dinâmico de alto custo que, diante do fim da guerra fria exige sua realização, revelando-se como crise de superprodução de equipamentos militares e de alta tecnologia. Neste contexto, os produtos tecnológicos do complexo industrial-militar se transplantam para toda a economia, e com eles a revolução informacional, elevando a capacidade produtiva do sistema a uma escala planetária e, dialeticamente, às contradições que negam sua base material de existência social: o valor-trabalho e a contradição capital-trabalho, impulsionando o declínio da taxa de lucros, o crescimento da superpopulação relativa (exército industrial de reserva), logo, a manifestação da Lei Geral da Acumulação Capitalista. Podemos observar este fenômeno nos EUA, a partir de 1973, como demonstra o estudo de Vitor Eduardo Schincariol, Endividamento externo da economia dos Estados Unidos (1980-2004): uma interpretação kaleckiana , 3 - 5 de setembro de 2008, Simpósio de Pós-Graduação em História Econômica, na USP - (Universidade de São Paulo)6.

A Lei Geral da Acumulação Capitalista (LGAC), na Rotação Global do Capital na sociedade, que se desenvolve ora pela Lei Tendencial da Queda da Taxa de Lucro (LTQTL), ora pela Lei da Superpopulação Relativa ou Exército Industrial de Reserva, tem por termômetro a composição orgânica do capital (a relação proporcional entre o capital variável/capital constante), e interage com a lei do desenvolvimento histórico da sociedade, a luta de classes (entre trabalhadores e patrões; a concorrência entre capitalistas), em perene dinâmica de retro-alimentação dos ciclos econômicos e suas crises, desdobrando-se sempre em intensificação tecnológica (aumento da composição orgânica) e expansão do capital fictício (bolha especulativa), seja pelo prolongamento do movimento ascendente do ciclo, através da elasticidade do capital dinheiro portador de juros (bancário), seja pelo artifício da indústria da guerra (conquista de novos mercados, fontes de matérias-primas ou, em última análise, a destruição violenta das forças produtivas já desenvolvidas). Em todos estes casos, o processo de acumulação capitalista avança tanto pela concentração quanto pela centralização, elevando o padrão de acumulação à escala máxima de monopólio, compensando a queda relativa da taxa pela escala da massa, de mais-valia e lucro. No limite, o processo de substituição do homem pela máquina (o desemprego em massa) exerce a lei da gravidade, então a queda relativa do consumo social se manifesta na falência dos agentes econômicos que não têm como honrar seus compromissos (inadimplência, moratórias, defraudações, especulações, golpes) conduzindo à desmoralização destes, revelando-se assim, o que atualmente se convencionou “bolha especulativa”. Neste momento, a elevação das taxas de juros ao pico freia o crédito, mas já é tarde: o descenso do ciclo econômico já havia se produzido há muito. Então a crise econômica se manifesta no sistema financeiro, a Lei do Valor, de Marx, exerce sua força de gravidade, a massa monetária reduz seu poder de representação (crash nas bolsas) e ocorre a deflação de preços (redução dos preços das mercadorias em relação ao seu valor-trabalho); os investimentos caem, vem estagnação, recessão ou depressão e toda a sociedade volta ao estágio de barbárie social, revelando a crise econômica, social e política, configurando que o modo de produção foi conduzido à contradição insolúvel de negar-se a si próprio, tanto pela deformação dos seus valores econômicos – o capital monetário perde a referência no capital produtivo (mercadorias e valor-trabalho) formando o que Marx denomina de pletora de capital monetário (a bolha financeira) – quanto pela alteração do metabolismo e retro-alimentação entre os departamentos I e II (bens de produção e bens de consumo) da economia, consumando-se as crises de realização (financeira), superprodução (industrial), crise moral (defraudações, golpes, especulações, perdas dos valores sociais), crise social (violência, expropriações, revoltas econômicas) e política (mudanças de governos, políticas econômicas, guerra de classes e intraclasses).

A negação do homem pela máquina que a revolução informacional desenvolveu, sob a doutrina neoliberal, aprofundou todas as contradições econômicas e sociais do sistema, levando-o ao paroxismo. Ela amplificou todas as contradições econômicas, tornando-se letal ao sistema. Ao se desenvolver na indústria das comunicações e entretenimento elevou-as a uma condição de indústria de guerra e parte estratégica do complexo industrial-militar, ampliando incomensuravelmente seu  poder de informação (inteligência militar) e formação de opinião (propaganda ideológica, contra-informação) e guerra psicológica (terror) das oligarquias  financeiras e do imperialismo sobre as massas e adversários. A mídia impressa, falada, telematizada, digital, audiovisual, por cabo de fibra ótica, ondas de rádio, sinais de satélites, dialógicos ou digitais, infravermelho, etc., os produtos da “nova economia”, artilharia pesada, quase tornam uma verdade o teorema de Paul Joseph Goebbels, “repita uma mentira mil vezes até que ela se torne uma verdade”. E assim, o imperialismo se vê à vontade para criar heróis e bandidos, o império do bem e o império do mal, distorcer os valores sociais e a realidade, como se pode comprovar pela justificativa da guerra contra o Iraque – “as armas de destruição em massa” – para esconder seu real motivo: apoderar-se das reservas de petróleo daquele país. E isto vale para a manipulação financeira nas bolsas de valores, na política eleitoral, no terrorismo de Estado, espionagem e controle da sociedade – cuja expressão metáfora se encontra no filme Matrix.

Contudo, a situação criada pela revolução cibernética é ainda mais terrível, porque ela, ao se desenvolver no setor financeiro, multiplicou a elasticidade do capital dinheiro, criando a moeda digital e virtual, acelerou as transações econômicas ao ritmo frenético das conexões em rede telemática, Internet, Intranet e de telecomunicações. Surgiram os cartões de créditos, os caixas eletrônicos, os leitores óticos de cartões e de transmissão de dados, ampliando a já volumosa quantidade de meios de trocas e pagamentos na sociedade, expandindo a base monetária que hoje calcula-se 6 vezes maior que o PIB (Produto Interno Bruto) da economia mundial. Mas, o fenômeno mais sintomático desta relação promíscua entre o capital financeiro e a indústria telemática são as transações nas bolsas de valores. A aplicação dos produtos da indústria informacional e de telecomunicações, das chamadas empresas de alta tecnologia, foi tão difundida no sistema financeiro que deu lugar a um setor especial de especulação financeira das ações destas empresas: a Bolsa de Valores Nasdaq. Mas o que mais chama atenção nesta relação estreita entre capital financeiro e as empresas de alta tecnologia é sua ligação com os mercados derivativos dominados pelos hedges funds (fundos especulativos), que segundo o BIS (Banco de Compensações Financeiras) chegou à incalculável soma de 10 vezes o PIB mundial, ou seja, US$ 596 trilhões. O movimento especulativo dos fundos dirige-se para títulos derivados das operações de alto risco, com ações de empresas prestes a falir ou que se lançam à aventura do mercado de ações, como foram os casos das ponto.com. A ação dos fundos nas bolsas nos últimos momentos antes de encerrar o pregão faz a sua orgia fazendo cair e subir seu índice, levando à loucura os investidores conservadores e isto só foi possível graças à telemática que globalizou estes fluxos especulativos.

Foi assim que surgiu o magnata da “nova economia” da Microsoft, Bill Gates, a exemplo dos donos da Yahoo!, Wal-Mart, Vale do Silício, Amazon e outras que sobreviveram ao estouro da bolha deste setor em maio de 2001, que havia sido elevada ao extremo pelos fundos de hedges, e tudo indica que sobreviveram à crise atual, pois segundo a revista The Fortune, o dono da Microsoft continua  tendo a segunda maior fortuna do mundo. No ano 2000, às vésperas de estourar a bolha das “ponto.com”, esta empresa tinha valorização na bolsa superior ao PIB da Argentina, cerca de US$ 350 bilhões, quando foi condenada por prática de monopólio e anticoncorrência, num só dia se desvalorizou em US$ 83 bilhões, o equivalente ao PIB do Chile. No final dos anos 90, os EUA eram donos de 32% do PIB mundial e dominavam 73% dos negócios da nova economia. Robert Shiller, professor da Universidade de Yale, em seu livro Exuberância Irracional, demonstrou a bolha de alta tecnologia, como sintetizou em artigo Paul Krugman, partindo da comparação entre o valor PL das empresas mais valorizadas do capitalismo antes da Internet, com PL médio das empresas de alta tecnologia. O índice mede a alavancagem das ações na bolsa através da divisão do P (preço de pregão da ação) por L (lucro por ação da empresa que emite). O resultado indicava que enquanto as primeiras PL situavam-se entre 6 e 14 e os acionistas já desconfiavam e fugiam destas ações, pois significavam que as empresas em cerca de um ano pagariam 6 ou 14 vezes mais seu valor, as segundas chegavam ao incrível índice de 200, no caso da Yahoo! seu PL era 1000. Isto explica em parte porque quando do estouro da bolha da “nova economia” na Nasdaq, mais de 200 empresas tidas como exponenciais faliram.

A crise mundial financeira atual, iniciada pelo estouro da bolha imobiliária no setor de hipotecas subprime nos EUA (empréstimos de alto risco), ilustra bem este fato. Em termos de economia nacional, o estímulo ao crédito e ao consumo implica estímulo à produção. E quando este estímulo ou facilitação de crédito se volta prioritariamente para o setor imobiliário e da construção civil, isto indica que os demais setores da economia já haviam chegado ao limite. O desdobramento natural deste processo é, por um lado, o crescimento artificial do consumo e, conseqüentemente, da produção, que nas condições atuais de globalização vai sempre além dos limites absolutos de consumo da sociedade e, por outra, a formação das bolhas financeiras e dos movimentos especulativos até explodi-las, como ocorreu recentemente, e que somente no mercado de hipotecas nos EUA estima-se em derivativos 12 trilhões de dólares. Não necessitamos dizer que a especulação sobre os títulos de hipoteca, seja pelos bancos, seja pelos fundos de hedge, no mercado derivativo inflou os valores dos imóveis, logo, da representação de valor dos mesmos nas bolsas. E também que o valor das ações das empresas do setor e relacionadas ao mesmo igualmente sofreram esta deformação, menos ainda o valor de todas as empresas que detinham os títulos e, finalmente, que toda a economia americana sustentou o prolongamento do seu ciclo com base nesta espécie de bolha de todas as bolhas. Quando passou-se a registrar o crescimento da inadimplência das pessoas físicas, durante o ano de 2007, resultando na perda de 1 milhão de moradias, a elevação da taxas de juros logo denunciou a crise. O freio no crédito com a alta dos juros aprofundou a falência das pessoas físicas, logo refletindo a queda na demanda por imóveis e a queda no seu valor, desencadeando a falência das empresas mais comprometidas diretamente com o processo das hipotecas. Então os fundos de hedge descarregam sua posição em títulos imobiliários e a bolha estoura e com ela começam a estourar, uma a uma, as bolhas nos diversos setores.

O crash das bolsas em todo o mundo, segundo as notícias que oscilam todos os dias, já torram cerca de 50% da montanha trilhardária de capital fictício em circulação atualmente. Segundo o BIS, este montante ultrapassa em mais de 3 vezes o valor do PIB mundial,ou seja, 167 trilhões de dólares; isto fora o mercado derivativo mundial, a praia dos hedge funds, que o BIS estima-se um valor entre 9 a 10 vezes maior que o PIB mundial de 54,3 trilhões de dólares. Os mais otimistas, com base nos pacotes baixados pelos governos dos EUA, França, Inglaterra, Alemanha, Japão, Espanha, Rússia, acham que a soma pode chegar a 4,4 trilhões de dólares. E o que isto representa? Por um lado, a expansão ainda maior da base monetária por todos os países em contradição à recessão mundial prevista diante da retração dos investimentos produtivos. Segundo o relatório da ONU apresentado em maio de 2008, neste ano o PIB será de apenas 1,8% e para 2009 em torno de 1,4%, com destaque para os EUA, cujo PIB cairá para - 0,2% e em 2009 chegará no máximo a 0,2%; da queda do consumo global, enfim, configurando-se o movimento de descenso do ciclo econômico mundial. Por outro lado, a futura guerra comercial e financeira, entre os países mais desenvolvidos  no capitalismo e destes com os países ditos “emergentes”, a deflação das moedas e dos preços das commodities, para através das importações manterem a atividade econômica, ao passo que os preços dos alimentos continuarão a sofrer aumento. A OIT recentemente divulgou um relatório em que chama atenção para a taxa de desemprego que crescerá, estimando o total de perdas de postos de trabalho em 20 milhões e aumentando para cerca de 100 milhões o número dos que recebem até 1 dólar por dia; a FAO (Organização para Agricultura e Alimentação da ONU) divulgou relatório chamando atenção para o crescimento da fome e pobreza  mundiais. O recente relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) já aponta que as desigualdades aumentaram de 7% a 8% em relação aos anos 80, e a quantidade de pobres de 9,3% para 10,6% no conjunto da população. Enfim, a crise social se ampliará e com ela as crises políticas em todos os países.

A corrida do capital financeiro para o porto seguro dos títulos do tesouro estadunidense infla o dólar em relação a todas as moedas do mundo, aumentando as dívidas externas de todos os países, podendo levar à bancarrota e moratória as economias mais fracas, como já se esboçou na Islândia. O enfraquecimento do euro coloca em risco a “União Europeia”, além disso, a guerra pelas exportações poderá conduzir ao impasse do comércio mundial de forma mais drástica. A crise de superprodução se apresentará em todos os níveis. Enfim, o mundo vive a síndrome do crash de 1929 e da grande depressão dos anos 30, cuja conseqüência foi a II Guerra Mundial. A fuga do capital financeiro para os EUA potencializa enormemente esta tendência, visto seu nível de endividamento interno e externo (pessoas físicas, jurídicas e governo) que hoje corresponde a três vezes em valor ao seu PIB, isto é cerca de US$ 41,4 trilhões de dólares. Em 2005, como afirmou Gunter Franz, “deixou de pagar 40% de seu trilhão de dívida externa e ninguém deu uma palavra a não ser o The Economist7. Este fato, ao contrário do que muitos falam, não indica a confiança na economia norte-americana, mas, sobretudo, o poder militar dos EUA, portanto, um fator que indica uma possibilidade de alto risco para a humanidade. O desespero dos países mais atingidos pela crise na União Europeia, que tem previsão de crescimento este ano de 2008 de 1,1% e para 2009 de 1,2% (segundo relatório da ONU), como são os casos da França, Alemanha, Inglaterra, Espanha, Itália e Holanda, levam as articulações de um novo Bretton Woods para uma reforma global do sistema financeiro mundial. Chega a ser irônico os governos neoliberais eleitos para fazer avançar as reformas contra as reminiscências keynesianas, que pregavam o império do mercado sobre todas as coisas, serem os primeiros a estatizar e regular a economia. Assim, a crise tende a se acentuar, vindo em ondas de impacto cada vez mais globais e ameaçadoras.

 

d) A luta das oligarquias contra as crises cíclicas

A luta histórica dos capitalistas para superar as leis tendenciais do seu modo de produção, que se sintetizam na Lei Geral da Acumulação no curso do ciclo de produção e reprodução ampliada durante sua rotação global – elevação da composição orgânica do capital, queda da taxa de lucro, concentração, centralização, monopólio, a superpopulação relativa ou exército industrial de reserva – que resultam nas crises cíclicas, é algo que remonta a sua pré-história e compreensão do papel da mesma na estrutura lógica e histórica do sistema. Quando começa a se recuperar da última grande “depressão” (1873 a 1895), na virada do século XIX para o século XX, a exportação de capitais revelou-se como nova tendência histórica da acumulação capitalista. O monopólio, idéia formulada por Marx no capítulo sobre “A Chamada Acumulação Primitiva” em O Capital, já era uma realidade. Lênin em seu livro Imperialismo: fase superior do capitalismo demonstra que a lei da concentração de Marx foi o veículo que conduziu as estruturas do capitalismo da livre concorrência ao monopólio. Que o fenômeno da concentração se desenvolve através das crises cíclicas do capital, onde os capitais mais fortes absorvem os mais fracos, nomeadamente o capital bancário, formando grandes corporações monopolistas, em associações, cartéis, trusts e sindicatos. Que da fusão do capital bancário, industrial, originou-se a oligarquia financeira e a capacidade de exportar e concentrar capitais pelo parasitismo financeiro que neste ponto se apoderam do aparelho do Estado, conformando os estados rentistas.

Este processo, sob o paradigma do liberalismo econômico de Smith, Mill e Say, levou à partilha do mundo pelos monopólios imperialistas e as grandes potências, tendo por objetivo o domínio de mercados e fontes de matérias-primas, desencadeando uma nova corrida colonial, que se consumou na I Guerra Mundial, entre 1914-1917. A tese do ultra-imperialismo de Kautsky de paz, progresso social e harmonia a partir do pacto entre os monopólios únicos em cada país, sucumbiu na lei da concentração de capital e, ao contrário, levou o imperialismo da política de diplomacia à guerra, confirmando a tese de Carl Von Clausewitz, da “guerra como política por outros meios”. Assim, a saída imperialista das oligarquias financeiras consumou-se em guerra entre as grandes potências pela hegemonia do sistema, colonialismo, formação da oligarquia financeira e parasitismo econômico dos países imperialistas sobre os países mais pobres. O predomínio do capital financeiro conduziu à transformação dos grandes bancos em bolsas de valores, o monopólio da emissão de título e moeda escriturária desencadeou a orgia do capital especulativo, camuflado nos palimpsestos da escritura contábil. O imperialismo desenvolveu uma nova divisão social do trabalho, impondo aos países mais fracos a dependência tecnológica, financeira e militar. Flertou com a reminiscência do império colonial, prolongando sua opressão e exploração até o último quartel do século XX. Desenvolveu no seio da classe operária, uma aristocracia (o sindicalismo amarelo da II Internacional), cujo papel é a revisão do marxismo através do economismo liberal e do desvio da luta de classe para o oportunismo, o reformismo clerical e o parlamentarismo burguês visando domesticá-la face à intensificação da exploração e auferir assim altas taxas de lucros.

Entretanto, nada disso foi capaz de propiciar a estabilidade ao sistema ou impedir suas crises cíclicas, muito menos vencer as contradições basais do capital e as novas contradições que brotam neste momento histórico, cujas características principais Lênin em síntese definiu:

 

Se fosse necessário dar uma definição o mais breve possível do imperialismo, dever-se-ia dizer que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo.(...) Os monopólios, a oligarquia, a tendência para a dominação em vez da tendência para a  liberdade, a exploração de um número cada vez maior de nações pequenas ou fracas por um punhado de nações riquíssimas ou muito fortes: tudo isto originou os traços distintivos do imperialismo, que obrigam a qualificá-lo de capitalismo parasitário, ou em estado de decomposição. Cada vez se manifesta com maior relevo (...) a formação de “Estados” rentiers, de Estados usurários, cuja burguesia vive cada vez mais à custa da exportação de capitais e do “corte de cupões”. Seria um erro pensar que esta tendência para a decomposição exclui o rápido crescimento do capitalismo”8.

 

Marx ao explicar a crise do capital afirma:

 

A razão última de todas as crises reais é sempre a pobreza e a restrição ao consumo das massas em face do impulso da produção capitalista a desenvolver as forças produtivas como se apenas a capacidade absoluta de consumo da sociedade constituísse seu limite”9.

 

Partindo desta tese, Michail Kaleck desenvolveu seus estudos sobre a dinâmica dos ciclos. John M. Keynes associa-se a este e, refletindo o impacto da grande depressão dos anos 1930, desenvolve sua  Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, que passa à política oficial do capitalismo com o fim da Segunda Grande Guerra  (1944). A tese de Keynes, ancorada nos estudos de Kaleck, consiste precisamente em entender que se “a pobreza e a restrição do consumo das massas é a razão última de todas as crises” em contradição ao “impulso da produção capitalista desenvolver as forças produtivas como se apenas a capacidade absoluta de consumo da sociedade constitui-se seu limite”, então bastava planificar o consumo produtivo ou investimentos (que somado ao consumo individual constitui o consumo absoluto) para manutenção da demanda efetiva – a tese do pleno emprego. O Estado passa a intervir diretamente na economia, planejando-a e regulando-a através de políticas (tributária, fiscal, monetária e salarial) e de investimentos (na seguridade social e infra-estrutura), visando equilibrar os desníveis entre produção e consumo, atenuando o descenso dos ciclos.

Mas a teoria de Keynes, aprovada no Tratado de Bretton Woods, em 1944, se deformou. Sua proposta de criação de uma moeda padrão das trocas internacionais, ancorada em uma cesta de moedas, não é aceita pelos EUA, que impõem sua hegemonia financeira estabelecendo o dólar como moeda padrão com a conversibilidade em ouro (US$ 35=1 onça de ouro). Desde esta época, a teoria keynesiana se desenvolveu em duas vertentes: a americana e a europeia. A economia capitalista mundial seguiu um curso de recuperação e crescimento, atingindo seu auge em 1970. A partir deste momento, a recuperação da economia da Europa e Japão passa a competir no mercado mundial, reduzido pelo avanço do socialismo em 30% dos países do mundo. No curso de 1945 a 1970, embora os ciclos econômicos tenham ocorrido, a intervenção do Estado na economia atenuava as crises, de acordo com as particularidades do modelo keynesiano de cada país. No caso dos EUA, destaca-se pelo complexo industrial-militar, cuja base herda da II Guerra Mundial e se desenvolve sob o manto da guerra fria e da doutrina de “Contenção”, de George F. Kennan, fundamentando as “guerras anticiclo” (1953 –  Guerra da Coréia; 1968 – Guerra do Vietnã; 1973 – A IV Guerra Israelense-Árabe), levando sua economia ao patamar de 32% da economia mundial. E esta diferença básica no desenvolvimento das economias explica porque a primeira crise energética atinge de cheio a produção capitalista nos EUA, comprimindo a taxa de lucros e o seu crescimento.

Os EUA, ao contrário do velho continente, não sofreram a destruição do seu aparelho produtivo durante as duas grandes guerras, ao contrário, como outros países fora do cenário principal da guerra, beneficiaram-se enormemente desta catástrofe humanitária, desenvolvendo sua indústria para atender a demanda que se formava na Europa, o cenário principal, que paralisou sua economia e, ao final, destruiu sua estrutura e dos países colonizados pelas potências imperialistas europeias. A adaptação de uma parte da indústria dos EUA voltada inteiramente para a guerra, subsidiada pelo governo, dada a massa de capital financeiro que se desloca para o país desde a I Guerra Mundial e a demanda de exportações da Europa e demais países: esta é a origem do complexo industrial-militar americano e porque economicamente chegou ao impasse atual. Considerando que sua economia estruturalmente se centra nos pilares do complexo industrial militar e na indústria automotriz, a matriz energética, tanto de sua economia, como da sociedade como um todo, se centrou no petróleo. Os EUA, atualmente, consomem 25% do petróleo mundial. É assim que a crise energética eleva seus custos de produção que, somados aos custos da guerra do Vietnã e à derrota, passa a viver uma crise profunda. O crescimento do seu PIB, a partir de 1972, mergulha em índices negativos. É neste contexto que o governo rompe unilateralmente com o Tratado de Bretton Woods, retirando a paridade do dólar ao ouro e aumentando as taxas de juros para atrair os petrodólares dos xeiques árabes, detonando uma onda inflacionária mundial e a crise das dívidas externas, levando 19 países a pedir moratória. É neste momento também que toma lugar a doutrina do neoliberalismo, que nos anos 80 e 90 vai dominar a economia mundial e culminar no que se traduziu chamar “globalização neoliberal”.

Não necessitamos repisar sobre o que representou o neoliberalismo, como política econômica antitética do keynesianismo e do Socialismo. O que é importante registrar agora é que o resultado de suas políticas de concentração e centralização do capital, e ao mesmo tempo de ampliação da taxa de mais-valia e dos lucros com liberalização dos fluxos financeiros, da recomposição tecnológica da produção, privatização, desregulamentação do trabalho, flexibilização do trabalho e precarização, conduziu ao impasse definitivo na acumulação capitalista: a impossibilidade da mudança no padrão de acumulação. No caso dos Estados Unidos da América, isto se reflete de forma acentuada, pois, se faz crescer a economia, bate contra a lei da gravidade de sua dependência do petróleo; se tenta custear a alta dos preços do petróleo e tenta mudar a matriz energética da sociedade com a expansão da base monetária, inflaciona o mundo; se recorre à flexibilização do trabalho, vê o consumo interno cair, a superprodução se revelar, a taxa dos lucros declinar; se recorre à destruição física das forças produtivas, através da guerra, mergulha num déficit ainda maior e conduz a humanidade à crise humanitária de uma guerra termo-nuclear. As transformações tecnológicas desenvolvidas no mundo exigem a mudança de todas as relações sociais e a base de todo o impasse: a contradição entre o capital e o trabalho. E isto só é possível pela abolição dos paradigmas da propriedade privada e dos valores fundamentais do capitalismo, portanto, da revolução social.

Ao finalizar, lembremos Lênin ao desmistificar a essência do significado histórico do imperialismo e o período em que vivemos atualmente:

 

Que significa então a palavra “entrelaçamento”? Exprime unicamente o traço que mais salta aos olhos do processo que se está desenvolvendo diante de nós; mostra que o observador conta as árvores e não vê o bosque, que copia servilmente o exterior, o acidental, o caótico; indica que o observador é um homem esmagado pelos materiais em bruto e que não compreende nada do seu sentido e significação... o que se encontra por detrás dele são as relações sociais de produção que mudam continuamente, então percebe-se com evidência que nos encontramos perante uma socialização de produção, e não perante um simples “entrelaçamento”, percebe-se que as relações de economia e de propriedade privadas constituem um invólucro que não corresponde já ao conteúdo, que esse invólucro deve inevitavelmente decompor-se caso a sua supressão for adiada artificialmente, que pode permanecer em estado de decomposição durante um período relativamente longo (no pior dos casos, se a cura do tumor oportunista se prolongar demasiado), mas que, de qualquer modo, será inelutavelmente suprimida.”10

 

e) A transcendência da crise geral do capital para crise ambiental

O prolongamento do modo de produção capitalista, em sua fase imperialista, através do artifício da revolução cibernética conduziu a Revolução Industrial, iniciada no século XVIII, à sua terceira e última fase. Em síntese, a Revolução Industrial pode-se reduzir à invenção da máquina. Esta, historicamente, foi o artifício humano que consolidou o modo de produção capitalista, conduzindo o trabalho da subordinação formal à subordinação real ao capital, ou em termos da luta de classes, o domínio dos trabalhadores pelos patrões. Foi ela também que deu a base para a lei demográfica específica do capitalismo, a superpopulação relativa ou exército industrial de reserva (desemprego estrutural), permitindo a elevação da taxa de mais-valia e a reprodução ampliada do capital, logo, a taxa de lucro. Marx, em O Capital, quando descreve as partes que compõem a estrutura da máquina, afirma que foi a máquina-ferramenta a base da Revolução Industrial e que graças a esta foi possível a invenção da máquina-motor e, conseqüentemente, os mecanismos de transmissão e controle. Embora as máquinas mais complexas neste período já tivessem sistemas de programação em linguagem de máquina, este processo só se desenvolve plenamente na atualidade com a revolução cibernética. A tese de Marx sobre a essência tecnológica da Revolução Industrial contraria as diversas formulações de historiadores que atribuem a máquina a vapor (máquina-motor) à base técnica da Revolução Industrial. Em nossa tese, seguindo a idéia de Marx, a máquina a vapor representou apenas a segunda fase da Revolução Industrial que se desenvolveu a partir de meados do século XIX até a metade do século XX, elevando a contradição homem-máquina presente na luta dos cartistas de 1838-1848, na Europa, que nos dias atuais volta a ganhar contornos trágicos.

 

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Desempregado na Crise de 1929 portando cartaz onde se lê:
 "Quem vai me ajudar a conseguir emprego?
 Não quero caridade" (Waynestate University)

Nestes termos, podemos classificar a Revolução Industrial em três fases fundamentais, seguindo as revoluções tecnológicas nas partes que compõem a máquina: a primeira fase foi protagonizada pela máquina-ferramenta (que retira do homem o controle direto das ferramentas objetivadas de seu corpo); a segunda pela máquina-motor (que retira do homem a força que movimenta e dá ritmo a máquina-ferramenta), e a terceira, que vivenciamos em nossos dias, pela máquina de transmissão e controle – o computador – (que retira o controle inteligente direto do homem sobre o movimento da máquina), configurando-se assim o autômato “perfeito”, que Marx genialmente previu em sua análise do significado da fábrica e seu sistema de máquinas. Pode-se confirmar esta tese com base na reconfiguração do aparelho produtivo capitalista pós-revolução cibernética, pela automação intensiva das novas plantas industriais nos diversos ramos da produção, em especial, no setor automobilístico, onde se destacam os novos sistemas “inteligentes”: CAD (Computer-Aided Design), CAM (Computer-Aided Manufacturing), CIM (Computer Integrated Manufacturing) e os novos métodos flexíveis do trabalho, Just in Time e Kanban.

O que representou todo este desenvolvimento tecnológico no processo de produção em termos econômicos, políticos e ideológicos para a sociedade humana, sob o modo de produção capitalista? Para responder a esta questão, é mister compreender que os períodos que se seguiram à grande depressão da década de 30, que se resolveu pela II Guerra Mundial, no século passado, tanto o keynesianismo quanto o neoliberalismo decuplicaram a base material (as forças produtivas) sobre a qual a crise do capital incide nos dias atuais. A revolução informacional levou ao paroxismo a substituição da força muscular pela força mecânica; e o consumo de energia para tal fim e todo este processo de superprodução, supercomercialização, superconsumo e superpopulação relativa, ancorados no artificialismo monetário e no poder militar dos EUA, levou o modo de produção capitalista a ultrapassar os limites das forças produtivas nele contidas, levando ao esgotamento das fontes de matérias-primas e vida do planeta, entre as mais evidentes: o petróleo, a água, a terra e a biodiversidade.  Eis aí a resposta do porquê a crise do capital se tornou uma crise de transição no modo de produção social e que transcendeu para crise ambiental e humanitária, ameaçando todas as formas de vida, especialmente, a humana; bem como a ideia da barbárie social, como expressão primária da existência humana na relação contraditória à natureza, passou a significar mais que um momento dentro das crises cíclicas do capital – como afirma Marx no Manifesto Comunista de 1848 – para uma prospectiva de um mundo após a catástrofe de uma guerra termo-nuclear, ou após a manifestação aguda da crise ambiental, como preveem os cientistas e especialistas nesta disciplina – o cenário MAD MAX e a Cúpula do Trovão.

Não é tão simples entender e antever a obra humana que se desenvolve no curso deste início de século, especialmente, quando nos prendemos a um dos seus grandes traços que a compõe: a crise econômica, a crise política e a crise ideológica. E mais complexo ainda, quando todos estes fenômenos, que marcam historicamente a transição das sociedades humanas, em suas formas de existências, se combinam com uma crise ambiental que ameaça os meios naturais de subsistência da vida. Naturalmente, no curso da história da sociedade, crises ambientais sempre se fizeram acompanhar do processo de transformação dos meios sociais, mas estes fenômenos, nunca se fizeram tão agudos e determinantes como se manifesta neste momento. Marx afirmou na sua Introdução ao Prefácio da Crítica da Economia Política que: “um modo de produção nunca se extingue, antes de esgotar todas as forças produtivas que ele contêm”, e como vimos o capitalismo extrapolou estes limites, passando a exaurir as reservas de energia fóssil, de água potável e biodiversidade. E isto se expressa na relação direta com o desenvolvimento do modo de produção capitalista, não somente dos meios de produção (a terceira fase da revolução industrial) como da força de trabalho, com a formação do gigantesco exército de reserva que atualmente tenta controlar, lançando mão de políticas que retomam a pré-história do seu nascimento, tais como o darwinismo econômico (os mais fortes sobrevivem) e o malthusianismo social (o extermínio da população excedente); mas, sobretudo, na relação homem-natureza, tendo por finalidade o lucro. Este paradigma do capital necessita ser liquidado para o bem de toda a humanidade, deste só podemos esperar a catástrofe social e humanitária.

 

Algumas conclusões sobre a crise nos EUA e o Brasil

 

Como afirmamos no início deste trabalho, ainda não faltam os que continuam, por inércia ou oportunismo, a buscar argumentos para atenuar a situação, inclusive, nestes momentos de crise fazendo contrabando da teoria de Marx, entre a acumulação monetária e a acumulação real, para continuar com o invólucro apodrecido, agonizante e parasitário do sistema capitalista. Também é triste saber que somente este ano cerca de 2 milhões de estadunidenses perderam suas casas. Contudo, é ainda mais triste saber que “Bush ao invés de financiar a guerra contra o Iraque” – como afirma Stiglitz (ou a orgia do capital financeiro através dos seus pacotes, acrescentamos nós) – :

 

com um trilhão de dólares, os EUA teriam contratado mais 15 milhões de professores, garantido a assistência para 530 milhões de crianças, financiado as bolsas de 43 milhões de estudantes, teriam feito o saneamento das urbanizações miseráveis e renovado os arruinados edifícios das escolas de todo o país”11.

 

Mas é infinitamente mais odioso saber de sua opressão colonial: “a prisão norte-americana de Abu Ghraib, infamemente conhecida pelas fotografias de tortura que chocaram a todos em abril de  2004, também foi ampliada. Tem agora 4.000 pessoas. Atualmente, os EUA mantêm presas quase 11.000 pessoas no Iraque, o dobro do número de há um ano, em três prisões militares, estando uma nova em construção. Muitos dos presos que são mantidos na rede mundial de prisões militares dos EUA são crianças. O jornalista investigativo norte-americano, Seymour Hersh, escreveu no jornal britânico The Guardian que um memorando dirigido ao Secretário da Defesa Donald Rumsfeld imediatamente após a invasão de 2001 registrava “800 a 900 crianças paquistanesas de 13 a 15 anos de idade na prisão”. O professor de sociologia, Arlie Hochschild, escreveu no jornal The New York Times (29 de junho) que, no Iraque, “O Comitê Internacional da Cruz Vermelha informava ter registrado 107 detidos com menos de 18 anos durante visitas a seis prisões controladas pelas tropas da coligação. Alguns detidos chegavam a ter apenas 8 anos. A organização Human Rights Watch relatou que esse número aumentou desde então”. Alguns prisioneiros de Guantânamo – não é claro exatamente quantos – foram capturados com 15, 14 anos de idade ou ainda mais novos, e os EUA dizem que cerca de meia dúzia deles ainda hoje têm menos de 16 anos”12.

Da sua opressão sobre seu próprio povo: “Os Estados Unidos contam com o maior número de presos do mundo e têm a taxa mais alta na proporção presos/população do planeta. No dia 5 de dezembro de  2007, uma reportagem da agência de notícias espanhola EFE citou estatísticas do Departamento de Justiça dos EUA que mostravam que o número de detentos nas prisões do país aumentou em 500% durante os últimos 30 anos. No final de  2006, havia um total de 2,26 milhões de internos nas prisões estadunidenses, um aumento de 2,8% com respeito ao ano anterior. Esta quantidade é a mais alta dos últimos seis anos. acrescenta:

 

A população dos Estados Unidos representava apenas 5% da população do planeta, mas sua população carcerária representava 25% do total mundial. Eram 751 detentos para cada 100.000 cidadãos norte-americanos, muito acima das taxas de outros países ocidentais (EFE, 5 de dezembro de 2007). 96% dos presidiários estavam cumprindo penas de mais de um ano, o que significa que quase 1 em cada 200 cidadãos norte-americanos estava cumprindo este tipo de sentença”.

 

A crise política que derrubou o império britânico há cerca de um século tem a mesma natureza da crise atual que ameaça jogar por terra a hegemonia mundial dos EUA e seu sistema imperial. Eis porque já se desenha fortemente um quadro de multipolaridade, como é caso da Europa chamar em seu concurso uma solução para crise atual apontando a necessidade de um novo Bretton Woods; a América Latina dar vida a UNASUL (União das Nações da América do Sul); a Rússia retomar suas antigas fronteiras; a China emergir como potência mundial. Que ninguém se iluda quanto ao caráter desta crise, ela é uma crise geral do modo de produção capitalista, que retoma o processo de transição histórico da sociedade para um novo modo de produção, ainda não delineado em todos seus contornos, mas que avança nesta primeira década do século XXI, exigindo a intervenção dos sujeitos históricos, como classes sociais cônscias, para além da tragédia humana – guerras, caos econômico e social, catástrofes geológicas e climáticas que acompanham o processo –  o trabalho revolucionário e o esforço incansável na edificação de um modo de produção e vida mais elevado, justo e solidário para todos.

Naturalmente o império não cairá sozinho e o Brasil, como já afirmamos em outro trabalho, está como alvo do círculo de fogo imperialista sobre a América Latina. Mas isto deve ser tema para maior aprofundamento no próximo trabalho. O único que se pode dizer aqui é que até agora a crise fez a bolsa de valores de São Paulo cair em cerca de 54%. Que somente a Votoratim perdeu US$ 2,2 bilhões aplicados em títulos de hipotecas nos EUA e que ainda não se sabe o limite total das perdas dos especuladores brasileiros e quantas empresas e bancos afundarão, embora existam estimativas em torno de US$ 40 bilhões e o ministro Mantega já admita perdas de US$ 20 bilhões. A moeda brasileira, o real, se desvalorizou cerca de 40% frente ao dólar, elevando a dívida indexada na moeda imperialista. Que o Banco Central já queimou US$ 50 bilhões do total dos cerca de US$ 200 bilhões das reservas, para segurar a cotação do dólar comprometendo a capacidade de pagamento do país, aumentando o índice do risco-país que acarretará na queda dos investimentos externos, afetando a agricultura, a construção civil e a indústria automotiva, elevando o desemprego, a inflação e a carestia de vida. Que a dívida externa brasileira aumentou somente no mês de agosto, cerca de US$ 7 bilhões, chegando a casa dos US$ 212 bilhões e que em curto prazo vence cerca de US$ 42 bilhões. Que a dívida interna é 5 vezes a dívida externa, ou seja, cerca de 1 trilhão de reais e que o passivo em curto prazo chega a casa dos US$ 600 bilhões. Que o orçamento do governo para 2009 afetará ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e demais recursos destinados às áreas sociais. E, finalmente, que a reunião do G-20, convocada nos EUA, será a tentativa dos ianques repassarem os custos da sua crise para os países dependentes (“emergentes”) e o Brasil é forte candidato a este papel. Talvez aí esteja a razão de tanto riso à explicação do presidente do Brasil, na SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em suas declarações acerca do impacto da crise financeira mundial sobre o Brasil: “não vou visitar alguém que é doente terminal e dizer para ele, olha, lembra de fulano, pois é, ele morreu e o cara tinha a mesma doença”!

O Brasil necessita urgentemente de um caminho alternativo para que o país, em especial a classe operária e as massas empobrecidas possam se emancipar. E este caminho não será encontrado na orgia das oligarquias financeiras, sua única possibilidade é a integração continental sob as bases distintas da doutrina neoliberal, que tenha como objetivo, além das trocas iguais das mercadorias, a demarcação de um cinturão de segurança alimentar proibido ao biodiesel, a defesa das reservas hídricas potáveis e a biodiversidade, não somente da Amazônia Legal. Para tudo isto é necessário pensar geopoliticamente o país em termos da articulação de um sistema de defesa continental contra o imperialismo e isto é mais que a UNASUL, isto quer dizer uma revolução continental: Brasil, Venezuela e Cuba, podem liderar este processo.

 

Abaixo o sistema capitalista e imperialista!

O povo não pode pagar pela orgia do capital financeiro!

Pela demarcação de uma área de segurança alimentar no Brasil!

Não à guerra imperialista!

Viva à revolução comunista mundial!

 

Rio de Janeiro, 24 de Outubro de 2008

 

Bibliografia (não mencionada nas notas)

 

• BEVILAQUA, A. P. Crise na Ásia (Contribuição Para uma Análise Marxista da Crise do Capital). Rio de Janeiro: Inverta, 1998.

• KEYNES, John Maynard. A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. São Paulo: Nova Cultural, 1985 (Col. Os Economistas).

• MELLO, Leonel Itaussu Almeida de. Quem tem medo da Geopolítica? São Paulo: Hucitec/Edusp, 1999.

• Francisco Paulo Cipolla, Taxa de Lucros e Déficit Público nos EUA, revista de economia política, vol. 12, nº 2 (46), abril-junho de 1992.

• The Global Economy and OECD: Distilling Lessons from a Financial Crisis, http://www.oecd.org/document/12/0,3343,en_2649_34487_41420876_1_1_1_1,00&& enUSS_01DBC.html, novembro de 2008

• O romance está no ar – continuação, http: revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,EDG74393 -6012-420-1,00-O+ROMANCE+ESTA+NO+AR.html, novembro de 2008

• Fábricas de celulose brasileiras registram fortes perdas no 3º trimestre, http: //revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,MUL803112-5602,00-FABRICAS+DE+CELULOSE+BRASILEIRAS+REGISTRAM+FORTES+PERDAS+

• NO+TRIMESTRE.html, novembro de 2008

• Relatório Anual 2007: destaques operacionais, http: //www.icrc.org/web/por/sitepor0.nsf/htmlall/2007-annual-report-operational-highlights-270508?OpenDocument&style=custo_print, novembro de 2008

• José Luís Fiori, A moeda, o crédito e o capital financeiro. http://diplo.uol.com.br/2008-09,a2604.html, novembro de 2008

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• Perdas globais com crise podem chegar a US$2,8 trilhões, http: //www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/10/081027_mercados_prestonrg.shtml

• La otra crisis: Los precios de los alimentos y los combustibles siguen engendrando riesgos, 26 de septiembre de 2008, http: //www.imf.org/external/spanish/np/exr/cs/news/2008/092608s.htm

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